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Habilidades Sociais no Autismo: o que são e como desenvolver?

Na sala de aula, você não ensina apenas conteúdos. Ou seja, a cada roda de conversa, a cada brincadeira em grupo e a cada conflito que surge no recreio, você também está ensinando habilidades sociais, muitas vezes sem nem perceber.

E isso é ainda mais importante quando falamos de crianças com TEA. Por isso, ao compreender o que são habilidades sociais, como identificá-las e como desenvolvê-las no cotidiano escolar, você transforma interações em oportunidades reais de inclusão.

Confira!

O que são habilidades sociais?

Para começar, é essencial entender do que estamos falando quando usamos o termo habilidades sociais.

Desse modo, em termos simples, habilidades sociais são comportamentos aprendidos que ajudam a criança a se comunicar, interagir e se adaptar ao convívio com outras pessoas. Em outras palavras, elas organizam a forma como a criança:

  • olha para o colega,
  • pede algo com gentileza,
  • espera a sua vez,
  • compartilha materiais,
  • resolve conflitos,
  • expressa e compreende emoções.

Portanto, habilidades sociais formam uma base silenciosa, mas poderosa, de convivência e aprendizagem. Assim como leitura e escrita, elas não surgem prontas: a criança precisa que alguém ensine, modele, organize e fortaleça essas interações.

Sendo assim, na prática, a criança aprende habilidades sociais quando:

  • observa o que o adulto e os colegas fazem,
  • imita comportamentos,
  • participa de situações sociais reais,
  • recebe orientação clara e reforço positivo a cada avanço.

Pesquisadores brasileiros como Zilda e Almir Del Prette, referência mundial na área das habilidades sociais, destacam que esses comportamentos se constroem por meio de modelagem, reforço positivo e experiências guiadas de interação.

Logo, nessa perspectiva, família e escola atuam como parceiros, e o professor se torna um agente fundamental na construção dessas aprendizagens sociais.

E no contexto do TEA?

Quando falamos de crianças com TEA, a atenção às habilidades sociais precisa ser ainda mais intencional. Isso porque o autismo impacta a forma como a criança:

  • compreende sinais sociais implícitos (olhar, gestos, tom de voz),
  • percebe o momento certo de entrar em uma conversa,
  • entende as regras não ditas de uma brincadeira,
  • participa de trocas em grupo.

Muitas vezes, a criança quer se conectar, mas não encontra um caminho claro para isso. Portanto, é exatamente aqui que o trabalho com habilidades sociais se torna uma ponte entre o mundo interno da criança e o ambiente ao redor.

Estudos recentes, como o de Júlia Agostini e Lucas Freitas, publicado em 2022 na Psicologia Escolar e Educacional, mostram que o ensino estruturado de habilidades sociais — com modelagem, elogios, sinais visuais e rotinas claras — impacta diretamente o desenvolvimento social e acadêmico de crianças com TEA.

Quando a escola organiza essas experiências, a criança por exemplo:

  • se comunica mais,
  • participa com mais segurança,
  • se sente parte do grupo.

Por isso, habilidades sociais não são apenas “saber conviver”. Além disso, elas ajudam a criança com TEA a compreender o mundo social, a se expressar com segurança e a encontrar seu lugar no grupo.

Como identificar quando uma criança com TEA precisa de apoio em habilidades sociais?

Depois de entender o conceito, vem uma pergunta essencial: como perceber que uma criança com TEA precisa de um treino mais estruturado de habilidades sociais?

Na rotina da escola, os sinais aparecem em pequenos gestos. Uma revisão recente da Universidade Federal de São Carlos, publicada em 2023 na revista Perspectivas, mostra que as habilidades sociais se revelam em situações simples do dia a dia. Assim, quando elas ainda estão em construção, isso aparece em detalhes como:

  • a criança fica perto dos colegas, mas não entra na brincadeira;
  • observa o grupo, mas não entende o momento certo de participar;
  • não compreende bem o “jogo social” – regras, trocas, expressões;
  • tem dificuldade para dividir materiais ou esperar a vez;
  • reage com muita frustração a pequenas mudanças de rotina;
  • não percebe com facilidade o que o outro está sentindo (tristeza, chateação, incômodo).

Sendo assim, essas situações não são “problemas de comportamento”. Elas são indicadores de que a criança precisa de apoio. Por isso, em vez de julgar, o professor observa, registra e transforma esses momentos em oportunidade de treino.

Sinais práticos na rotina escolar

Você pode perceber que uma criança com TEA precisa de apoio em habilidades sociais quando, por exemplo:

  • ela sempre prefere brincar sozinha, mesmo estando curiosa com o grupo;
  • não consegue iniciar uma conversa, mesmo querendo interagir;
  • insiste em uma mesma forma de brincar, sem considerar o colega;
  • não entende bem o que acontece quando alguém está bravo ou triste;
  • se desorganiza com mudanças simples, como trocar de atividade ou de lugar.

Mais uma vez, o ponto central é este: não se trata de falta de interesse, mas de falta de repertório social. A criança não ignora o grupo por escolha; ela ainda está aprendendo como fazer parte dele.

Por isso, o olhar do professor é decisivo. Na roda de conversa, na hora do lanche, nas atividades em dupla ou grupo, você pode observar:

  • quem sempre chama,
  • quem nunca chama,
  • quem se aproxima e recua,
  • quem precisa de ajuda para compartilhar e cooperar.

Logo, é a partir disso, que você organiza intervenções simples e constantes. É assim que o treinamento de habilidades sociais começa: na convivência, e não apenas em protocolos formais.

Estratégias práticas para treinar habilidades sociais na sala de aula

Agora que você já sabe identificar sinais de que uma criança com TEA precisa de apoio, vem a parte mais prática: como treinar habilidades sociais usando a rotina que você já tem? Veja as dicas!

1. Roda de conversa com propósito social

A roda de conversa não serve apenas para “contar novidades”. Ou seja, ela é uma excelente oportunidade para treinar habilidades sociais, como:

  • esperar a vez,
  • ouvir o outro,
  • fazer perguntas,
  • comentar o que foi dito.

Você pode, por exemplo:

  • pedir que uma criança conte algo que viveu no fim de semana;
  • orientar o colega a fazer uma pergunta sobre o que ouviu;
  • destacar em voz alta comportamentos positivos:
    • “Você esperou sua vez para falar, isso ajuda todo mundo a participar.”
    • “Gostei de como você ouviu o colega até o fim antes de comentar.”

Assim, você transforma a roda em um espaço de treino de escuta, turnos de fala e respeito.

2. Brincadeiras com regras claras

Jogos e brincadeiras com regras são aliados poderosos no treino de habilidades sociais. Eles ajudam a criança a:

  • esperar,
  • aceitar pequenos desafios,
  • lidar com o resultado (ganhar e perder),
  • respeitar combinados.

Desse modo, brincadeiras como “dança das cadeiras”, “corre cotia”, “jogo da memória” ou “passa anel” podem se tornar momentos de intervenção, especialmente se você:

  • antecipa o que vai acontecer,
  • explica a regra de forma simples,
  • usa recursos visuais (cartazes de “minha vez” / “vez do colega”),
  • verbaliza o que a criança fez bem:
    • “Percebi como você chamou o colega para participar, isso é ter cuidado com o outro.”
    • “Você perdeu, mas conseguiu continuar na brincadeira. Isso é muito importante.”

3. Histórias sociais para antecipar situações

Outra estratégia muito eficaz para desenvolver habilidades sociais no TEA é o uso de histórias sociais: pequenos textos com imagens que explicam situações do cotidiano e mostram o que vai acontecer e o que se espera da criança.

Por exemplo, antes de uma ida ao parque, você pode construir uma história com frases simples, como: “Hoje vamos brincar no parque. Lá terão outras crianças brincando. Eu posso esperar a minha vez no escorregador. Quando chegar a minha vez, eu escorrego e depois posso escolher outro brinquedo.”

Esse tipo de narrativa:

  • antecipa a situação,
  • organiza o que a criança pode encontrar,
  • esclarece o que é esperado dela,
  • reduz o medo diante do novo.

Você também pode criar histórias sociais para momentos específicos da sala de aula, como por exemplo:

  • “Como pedir ajuda para a professora”,
  • “O que fazer quando quero conversar com o colega”,
  • “O que posso fazer quando fico muito bravo”.

O importante é manter textos curtos, imagens claras e reler sempre que necessário.

4. Jogos estruturados com combinados visuais

Jogos de tabuleiro simples, como dominó, Uno, jogos de memória e outros, ajudam a organizar as interações porque possuem:

  • regras definidas,
  • ordem de jogadas,
  • papéis claros.

Você pode:

  • criar cartõezinhos com “vez do colega” / “minha vez”,
  • combinar frases que todos podem usar, como “posso jogar agora?”,
  • reforçar a ideia de que errar faz parte do jogo:
    • “Se errar, tudo bem, a gente tenta de novo.”

Dessa forma, habilidades sociais vão sendo treinadas sem que a criança sinta que está “num exercício”. Ela aprende brincando, com apoio concreto.

Habilidades sociais e emocionais: qual é a diferença?

Em muitos casos, o maior desafio das crianças com TEA não está apenas em aprender o conteúdo escolar, mas em entender as pessoas e lidar com o que sentem. Por isso, é fundamental diferenciar e, ao mesmo tempo, integrar duas dimensões: habilidades sociais e habilidades emocionais.

  • Habilidades sociais dizem respeito à forma como a criança se relaciona com o outro:
    • esperar a vez,
    • pedir ajuda,
    • dividir materiais,
    • resolver conflitos,
    • interpretar o que o colega quis dizer.
  • Habilidades emocionais se conectam ao que a criança sente e como reage:
    • reconhecer a própria emoção,
    • perceber o que o outro sente,
    • conseguir se reorganizar quando algo sai do esperado.

Um estudo desenvolvido na Universidade Presbiteriana Mackenzie, por Samantha Maranhão e Izabel Pires, mostra que o desenvolvimento das habilidades sociais e emocionais se relaciona diretamente com linguagem e autorregulação, e não apenas com “inteligência”.

Em outras palavras, mais importante do que “o quanto a criança sabe” é como ela consegue expressar, compreender e lidar com aquilo que sente e percebe no outro. Essas duas dimensões se completam:

  • a habilidade social organiza a ação com o outro;
  • a habilidade emocional organiza a compreensão de si e do outro.

Além disso, quando o professor abre espaço para falar de sentimentos, nomear emoções, acolher frustrações e valorizar atitudes de empatia, ele constrói um terreno fértil para as habilidades sociais florescerem com mais segurança.

Por isso, nunca subestime o poder de pequenas conversas, de uma escuta atenta ou de um tempo para a criança respirar e reorganizar o que sente. Quando a criança aprende a se entender, ela também se fortalece para entender o outro, dessa forma, esse equilíbrio entre emoção e relação sustenta uma convivência mais saudável para toda a turma.

Habilidades sociais e inclusão escolar: o que quase ninguém te conta

Quando pensamos em inclusão, é comum olhar primeiro para as adaptações de conteúdo: prova adaptada, atividade diferenciada, material ajustado. Tudo isso é importante, mas não é suficiente.

Logo, a verdadeira inclusão começa quando a escola ensina a conviver. Ensinar habilidades sociais é um dos primeiros passos para uma inclusão que acontece de fato, e não apenas no papel.

Isso significa:

  • ensinar o que é respeitar o outro,
  • apoiar a criança para esperar e compartilhar,
  • criar espaço para diferentes formas de participação,
  • valorizar cada tentativa de interação, por menor que pareça.

Antes de aprender o conteúdo, a criança precisa aprender como estar com o outro. E quem organiza essas experiências é o professor, com seu olhar, sua escuta e as oportunidades que cria para que cada aluno se sinta parte do grupo.

Portanto, centros internacionais de pesquisa em práticas baseadas em evidências para o autismo destacam o ensino de habilidades sociais como uma das estratégias com maior comprovação científica para ampliar participação e autonomia de pessoas com TEA.

Ou seja, o que você faz em sala de aula tem base científica, tem propósito e transforma trajetórias. E há um ponto essencial: ensinar habilidades sociais não é mudar quem a criança é. É oferecer ferramentas para que ela participe do mundo com mais segurança, autenticidade e voz. É permitir que ela seja quem é, com seu jeito único, e ainda assim tenha espaço para conviver, aprender e ser reconhecida.

Conclusão

Trabalhar habilidades sociais no contexto do autismo não é um extra, nem um “detalhe” da rotina: é parte central da prática pedagógica inclusiva. Por isso, quando você:

  • Entende o que são habilidades sociais;
  • Reconhece sinais de que a criança precisa de apoio;
  • Organiza atividades simples com intencionalidade;
  • Integra emoções e relações no planejamento.

Logo, cada roda de conversa, cada jogo, cada história social e cada escuta atenta se torna uma oportunidade de ensinar a conviver. E é assim, passo a passo, que a inclusão deixa de ser discurso e passa a ser experiência concreta para cada criança na sua sala de aula.

Por isso, se você busca conhecimento baseado em evidências científicas conheça a Pós-graduação em Transtorno do Espectro Autista – TEA da Rhema Neuroeducação. Logo, você estuda com especialistas, aprende estratégias práticas e transforma sua atuação em sala de aula.

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Cada criança é um mundo. Te preparamos para cada uma delas.

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